O princípio da mitigação do próprio prejuízo, enquanto dever lateral da boa-fé objetiva, a limitar montante indenizatório do credor, pela demora no ajuizamento de demanda judicial.
O Novo Código Civil inovou ao prever expressamente o princípio da boa-fé objetiva no âmbito dos negócios jurídicos. Tal princípio implica conduta honesta, leal e correta por parte dos contratantes. Com expressiva força na interpretação contratual, a boa-fé objetiva impõe aos contratantes deveres colaterais, quais sejam, de informação, cooperação, cuidado e respeito e de agir conforme a confiança depositada, com lealdade e probidade.
Esses deveres colaterais – também denominados anexos, laterais ou secundários – não necessitam de previsão no instrumento contratual para que sua violação acarrete responsabilização civil daquele que os desrespeita. Conforme Enunciado 24 do CJF/STJ, aprovado na I Jornada de Direito Civil de 2002, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa. A violação positiva do negócio jurídico classifica-se como abuso de direito, portanto, é objetiva a responsabilidade civil que dela emana.
Alguns institutos jurídicos do direito comparado auxiliam os operadores do direito na aplicação de tal princípio à luz do Código Civil de 2002 – exemplificativamente, os institutos de Supressio, Surrectio, Tu quoque, Venire Contra Factum Proprium e Duty to mitigate the loss. O presente artigo se debruça sobre a mitigação do prejuízo pelo próprio credor (duty to mitigate the loss).
A mitigação do próprio prejuízo constitui um dever colateral derivado da boa conduta que deve existir entre os negociantes, conforme Enunciado 169 do CJF/STJ, aprovado na III Jornada de Direito Civil. Tal enunciado inspirou-se na Convenção de Viena de 1980, segundo o qual a parte que invoca a quebra do contrato deve tomar as medidas razoáveis, levando em consideração as circunstâncias, para limitar a perda, nela compreendido o prejuízo resultante da quebra contratual. Se ela é negligente em tomar tais medidas, a parte faltosa pode pedir a redução das perdas e danos, em proporção igual ao montante da perda que poderia ter sido diminuída.
Essa teoria tem sua aplicação em um contexto de jurisdicionalização de demandas em que o credor queda inerte por longo período de tempo em face ao inadimplemento do devedor, provocando significativo aumento do valor da dívida. Ao invés de o credor trazer o inadimplemento para o âmbito judicial de imediato, aguarda-se o escorrer do prazo prescricional até o último momento possível para, no ajuizamento da ação, beneficiar-se dos juros acumulados durante todo esse período de inércia.
Com base na boa-fé objetiva, no Recurso Especial n. 758.518-PR, o Ministro Relator Vasco Della Giustina relativizou o fato de determinada demanda ter sido proposta dentro do prazo prescricional. Para o Ministro, o não exercício do direito de modo ágil fere o preceito ético de não impor perdas desnecessárias nas relações contratuais. Portanto, a parte a que a perda aproveita não pode permanecer deliberadamente inerte diante do dano, pois a sua inércia imporá gravame desnecessário e evitável ao patrimônio da outra, circunstância que infringe os deveres de cooperação e lealdade.
Desta feita, ainda que o credor possa se valer de todo prazo prescricional para ter sua ação conhecida, já há decisões que limitam o montante indenizatório previsto no provimento judicial em decorrência da demora injustificada para o ajuizamento da demanda.
Artigo publicado no Portal Meu Advogado.